Junta Freguesia de Peniche Junta Freguesia de Peniche

História

Peniche é uma cidade portuguesa no distrito de Leiria, situada na província da Estremadura e integrando a Comunidade Intermunicipal do Oeste na região do Centro, com 13.212 habitantes (2021).[1]

É sede do pequeno município de Peniche que tem 77,55 km² de área[2] e 26 431 habitantes (2021) [3][4] e está subdividido em 4 freguesias.[5] O município é limitado a leste pelo de Óbidos, a sul pelo da Lourinhã e a oeste e norte pelo Oceano Atlântico.

Presume-se que o topónimo Peniche provém do latim vulgar pinniscula (península), o que significa que o termo se refere a um lugar e não a um povoado e que teve origem durante a Conquista romana da Península Ibérica.[6][7] Por efeito da evolução linguística o termo terá perdido as últimas duas sílabas. Os mais recentes achados arqueológicos em Peniche e nas Berlengas parecem confirmar esta hipótese.

 

A população da Península de Peniche e terras circundantes

O município de Peniche possui uma longa e rica história. Foi sucessivamente ocupado por populações que, ontem como hoje, fizeram da pesca e da agricultura as suas principais atividades económicas : agricultores locais que se tornam pescadores, pescadores migrantes provenientes de várias localidades da costa portuguesa, da Nazaré, da Póvoa de Varzim e do Algarve, que se tornam residentes, pescadores residentes que, de geração em geração, abandonam Peniche e emigram.  A especificidade geomorfológica e insular/peninsular de Peniche parece ter moldado e condicionado, de um ponto de vista socioeconómico e cultural, as populações que ao longo dos tempos ocuparam este território. [15] [16]

Peniche e o seu município são palco de importantes acontecimentos históricos de índole nacional e internacional. Perante frequentes assaltos de piratas e ocupações de potências estrangeiras,[17] foi terra defendida por uma construção fortificada, a Praça-forte de Peniche, mandada edificar pelo rei D. João III em 1557 e concluída em 1645 por D. João IV. Tendo sido praça militar em 1897 e bastião estratégico na defesa da península no século XIX,[18] abrigou refugiados da Guerra dos Bôeres nos primeiros anos do século XX e prisioneiros alemães e austríacos durante a Primeira Guerra Mundial. Tornar-se-ia célebre como prisão política durante o regime autoritário de António de Oliveira Salazar, entre 1934 e 1974, ano da Revolução dos Cravos. Recolheu ainda famílias de retornados das ex-colónias portuguesas de África. Quando estes se integraram na sociedade metropolitana, o forte tornou-se museu local, o Museu Municipal de Peniche.[19]

Em mapas do século XVI e XVII, a localidade aparece nomeada como Nova Lisboa. (Noua Lisbona)[20]

É a partir da segunda metade do século XV que têm início momentos determinantes da história social e política de Peniche. Em 1449 D. Afonso V doa as Berlengas e o Baleal [21] ao Infante D. Henrique. Em 1497 D. Manuel concede aos moradores de Peniche a possibilidade de possuírem carniçaria e carniceiro, o que lhes permite não terem de ir a Atouguia da Baleia comprar carne, e a possibilidade ainda de cortar lenha em terras do reino. Em 1503 autoriza ainda aos penicheiros semearem nas terras do reguengo, entre a Gamboa e a Ribeira. Em 1537 D. João III ordena que quatro navios armados patrulhem os mares de Peniche para impedir ataques de corsários. Em 1557 el-rei D. Sebastião manda construir o Baluarte do Redondo, junto do portinho da Ribeira. [22]

Em 1589 desembarca em Peniche um exército inglês liderado por António, Prior do Crato, tendo como missão a tomada de Lisboa e a restauração da independência do território português. [23]

No final da primeira década do século XVII, ano de 1609, a povoação de Peniche é elevada por Filipe II de Espanha, rei invasor, à categoria de vila e sede de concelho. Em 1642, o Conselho de Guerra instaurado por D. João IV após a Restauração da Independência considera Peniche “a principal chave do reino pela parte do mar” dando início a uma ampla política de fortificação da vila, que tinha cerca de 3600 habitantes. No ano de 1735 existiam nas fortificações de Peniche cerca de 50 peças de artilharia, ao serviço de uma guarnição permanente composta por 316 militares.[carece de fontes]

No ano sete do século XIX, a Praça de Peniche é ocupada por um regimento de Napoleão Bonaparte, durante a Primeira invasão francesa de Portugal[24] Em 1808 ocorre na vila um levantamento popular, rapidamente reprimido pelo invasor, que acaba por abandonar esta praça militar ainda nesse mesmo ano. Em 1851, as rendas de bilros de Peniche são premiadas com Medalha de Prata em exposições internacionais, tanto em Paris como em Londres. [25]

No século XX, em 1901, são albergados no forte de Peniche a maioria dos 400 boers refugiados da guerra travada contra os ingleses na África do Sul. Um questionário da Companhia Real dos Caminhos de Ferro, ano de 1904, revela que as maiores indústrias do município eram a pesca e as rendas de bilros, seguidas do fabrico de telha, tijolos e loiças. Como principais produtos agrícolas são apontados o vinho, o milho, o feijão, a cevada, a batata e a cebola. [26] A salga e secagem do pescado contribuia também para que muitas pessoas tivessem uma fonte importante de receita.[27]

Motoriza-se a pesca. As traineiras à vela serão cada vez menos. Em 1924 é lançada ao mar a primeira traineira a motor do Porto de Peniche, a ‘Carminha’, do armador Manuel Farto. A energia elétrica chega a Peniche em 1930. O município conta então com mais de 16000 habitantes, numa época em que a pesca da sardinha é o elemento dinamizador de uma importante indústria conserveira, cujo operariado é exclusivamente feminino.[28] No entanto a presença de cardumes de sardinha nos mares de Portugal apenas tem lugar na época do verão durante cerca de três meses. O restante pescado é insuficiente para permitir nas outras estações do ano o sustento tanto da população costeira como abastecer a indústria de conservas ou garantir o mínimo de lucros ao pequeno comércio. Todas as pessoas dependentes da pesca estão sujeitas a um modo de vida precário, dramático para algumas famílias, durante cerca de nove meses. A encosta sul da Península de Peniche, onde se situa o porto de abrigo, é de resto particularmente vulnerável ao mau tempo durante o inverno.[29]

O ano de 1936 é marcado por tais condições, por sérios motivos de ordem social e política. É neste ano que a fortaleza é convertida pelo Estado Novo (Portugal) em prisão para simples delinquentes e particularmente para resistentes antifascistas.

A Guerra das Espoletas

A "Guerra das Espoletas"[30] [nota 1] ou Revolta dos Mestres, refere-se a um levantamento popular em Peniche pelo direito ao trabalho, contra a fome e a miséria. «A 12 de Novembro, na véspera do motim, foram condenados na Capitania de Peniche os mestres e os proprietários das embarcações [nele implicados]. Aos mestres aplicou-se a pena de quatro meses de prisão, na cadeia das Caldas da Rainha e aos proprietários uma multa de 3.950 escudos que deveria ser paga até dia 16 de Novembro».

Culmina o levantamento no dia 13 de novembro de 1935. Envolve « (...) cerca de um milhar de homens e mulheres que pretendiam evitar a prisão dos mestres das traineiras e assegurar a pesca e a produção nas fábricas de conservas.» São então presos e condenados cerca de sessenta mestres. Logo no início da revolta, a vila é invadida por forças militares da Guarda Nacional Republicana (GNR) e por agentes da Polícia Internacional e de Defesa do Estado. São inicialmente « (...) destacados seis praças da Guarda Nacional Republicana que estavam na Fortaleza de modo a protegerem a saída das camionetas e o pessoal encarregado da reparação das linhas caídas [derrubadas pelos manifestantes]. A Guarda Nacional Republicana e o guarda fios que estava a tentar repor as comunicações foram atacados à pedrada no sítio conhecido como Juncal, segundo o relatório do Administrador do Concelho houve ainda tiros vindos da multidão». Do rescaldo, «(...) resultou a morte de um civil, Francisco de Sousa, marítimo e natural de Peniche e um ferido, José Mendes, marítimo, natural da Nazaré. Da parte da G. N. R. três praças ficaram feridos.» [31] São assim presos e condenados cerca de sessenta mestres de traineiras [32]. Os armadores, seus proprietários, são sujeitos a multas elevadas e as traineiras apreendidas.

Torce o braço o Governo. Refere este mesmo documento que «No dia 22 de novembro foi publicado no Diário da República o Decreto-Lei nº26/084 que concedeu a amnistia a todos os mestres de traineiras de Peniche condenados pelas infrações cometidas na lei nº 1/572, sendo arquivados os respectivos processos. Para os armadores foi publicado o Decreto-Lei nº 26/085 condenando-os ao pagamento de uma multa de 2.500 escudos sendo possível o pagamento em doze prestações mensais. Para este desfecho contribuiu a crise na indústria da pesca, a dificuldade de pagamento por parte dos armadores e a importância para a economia nacional».

Na versão do acontecimento proveniente da tradição oral das gentes de Peniche, teriam seguido para Lisboa os mestres das traineiras envolvidos no motim e encarcerados na Cadeia do Limoeiro[33] onde ficariam retidos durante três meses. Sem mestres não se pesca e a situação torna-se dramática. Sem trabalho nem peixe agrava-se a precaridade. Segundo consta, uma comissão de ‘homens bons’ de Peniche desloca-se então a Lisboa para tentar resolver o problema junto do Presidente da República Óscar Carmona. Mostra-se este sensibilizado, dizendo «Acima da Lei está a consciência dos homens». É voz corrente ser certo que quando a comissão volta a Peniche, os mestres já lá se encontram.

«A 15 de Dezembro deslocou-se a Peniche o Presidente da República General Carmona para inaugurar o início das obras do porto de pesca, acompanhado pelos ministros do Interior e das Obras Públicas o General Amílcar Mota e o comandante Sequeira Braga. O policiamento de Peniche foi reforçado pelo Batalhão nº 229 e no seu discurso, o General Carmona recorda o tempo em que passou em Peniche como tenente. O que poderá ter sido preponderante para a amnistia dos pescadores, referindo-se ao tema com a frase: «A lei impunha-se, mas às vezes acima da lei há o coração humano» (idem : “O motim de 1935”). Entre a primeira versão da mesma frase e a segunda há uma pequena-grande diferença. Na segunda lemos «A lei impunha-se» e logo a seguir «mas às vezes acima da lei (...) : estas vezes eram então mais que muitas e inexistentes ou raras aquelas que tocavam o coração dos homens.

Nesses anos conturbados, um dos mais importantes armadores de Peniche é Luís Correia Peixoto, que reside mesmo em frente da entrada do forte. Fotógrafo amador dedicado ao registo da faina marítima e do mar, deixaria um património iconográfico de considerável interesse e qualidade, que na sua maior parte se encontra em local desconhecido [34], além de dois livros em edição de autor, “Subsídios para a História da Arte de Anzol, Redes de Emalhar” e “Covos em Peniche” (2002), e ainda de uma publicação de bilhetes-postais ilustrados (2003). Parte dessas fotografias, depositada no Museu de Peniche, foi tema de uma exposição que aí teve lugar aquando da sua criação.

Fernando Engenheiro, arquivista do Museu de Peniche durante anos, traça com idêntica e esforçada minúcia não só o perfil deste generoso democrata numa época em que a ditadura de Salazar era mais feroz mas também o de outro armador não menos importante mas que, sendo católico fervoroso, era cúmplice do regime : Francisco de Jesus Salvador.[carece de fontes] Cineasta amador, é autor com algum talento de curtas-metragens sobre a construção das suas traineiras e de visitas de ilustres notáveis como o almirante Américo TomásHenrique Tenreiro ou o cardeal-patriarca Manuel Gonçalves Cerejeira, conhecido como “Príncipe da Igreja” [35].

Filme mudo, a preto e branco, tem algo de arrepiante : desvela ingenuamente poses bem estudadas e a encenação ostensiva de um grande senhor cheio de si próprio, transbordante de poder e de falsa simpatia. Aliás e paradoxalmente, qualquer um dos filmes de Francisco Salvador, dá-nos hoje a ver o contrário daquilo que pretendia. Revela aspectos não só da sua vida pública, tal era seu desejo, como também da sua vida privada sem estar ciente do que fazia. Tanto mostra gente submissa em tarefas do dia a dia, tais como um menino pobrezinho bem comportado, deslumbrado com o espetáculo graças à gentileza de um trabalhador do mar ao serviço do seu bom patrão (os miúdos típicos da época são em geral ranhosos, malcriados e maltratados) como o encanto brejeiro da sua elegante e bem torneada jovem esposa no memorável bota-a-baixo da sua nova traineira, o Campeão, logo seguido de outras belezas como as do Cabo Carvoeiro, o barco navegando de Peniche de Cima para Peniche de Baixo. É gloriosa a chegada do Campeão ao novo porto de pesca. E não se mostra nem se insinua que tal feito tem a sua marca.

Ficamos hoje um pouco chocados com tais subtilezas. À época raros eram aqueles que não aplaudiam. O significado de práticas como estas será indispensável a quem se dedica ao estudo da História Contemporênea. Indispensável será a quem procura respostas para um conhecimento adequado do Museu de Peniche. Em benefício de todos nós, a resistência ao fascismo sempre foi e terá de ser partilhada, com toda a legitimidade, entre as gentes da terra e quem esteve preso no forte. [36] [37]

Arqueologia

Forte de Peniche (em primeiro plano: fosso defensivo da fortificação)

O município de Peniche e a faixa marítima adjacente têm sido objeto, desde os finais do século XIX e, em particular, nos últimos anos do século XX e na década seguinte, de inúmeros projetos de investigação no campo da arqueologia, com trabalhos em que se tem lentamente reconstituído a sua história e a das suas gentes.

Povoamento na pré-história

Furninha revela vestígios de presença humana desde a época do Homem de Neandertal (há cerca de 30.000 anos). É o sítio neandertal mais ocidental da Europa e do mundo. Pela sua história e características, a gruta da Furninha é património de considerável importância.[38]

Colonização fenícia e romana

A arqueologia mais recente, envolvendo o período de colonização fenícia[39] e romana, dá-nos a conhecer ainda o retrato de um território que detinha uma posição de charneira no contexto de uma navegação comercial inter-regional e que acolhia, nos seus fundeadouros e estruturas portuárias, embarcações de grande tonelagem, como parece comprovado pela descoberta no mar da Berlenga de vários cepos de âncora em chumbo, entre os quais dois com cerca de 2,55 e 2,63m., com o peso de 423 e 422 kg. respetivamente. Um deles continha pequenos fragmentos da alma (haste) de madeira[40] cuja datação por radiocarbono indica ter origem entre os finais do século V e o início do século IV a.C.. Este facto permite-nos admitir a hipótese de «que este cepo pré-romano seja o mais antigo cepo de âncora conhecido de toda a Antiguidade podendo mesmo fazer recuar a data em que se pensava ter ocorrido a generalização do uso de cepos em chumbo no Mediterrâneo».[41][42][43]

Estes navios transportavam ânforas com vinho andaluz ou conservas de peixe lusitanas. A integração deste território nesta rede comercial de longo alcance terá favorecido a implantação de uma unidade fabril produtora de preparados piscícolas de garum, apoiada por um precoce complexo oleiro, situado no Morraçal da Ajuda [44] onde se fabricavam ânforas destinadas ao transporte da sua produção conserveira, realidade que perpetua a memória de uma atividade piscatória e industrial que ainda hoje, cerca de dois milénios depois, continua a pautar a vivência económica e social da gentes de Peniche.

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